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Religiões, ecologia e natureza por Fabrício Veliq

27 fevereiro 2020

No dia 9 de fevereiro, cientistas brasileiros registaram a temperatura de 20,75°C na Antártida (Reuters).

As religiões têm um papel fundamental no ensino de seus fiéis para o cuidado da natureza.

Fabrício Veliq*

Falar sobre a questão ecológica é um imperativo de nossos dias. Por mais que haja quem afirme loucamente não haver aquecimento global, que isso seria só mais uma fase como as diversas pelas quais a Terra já passou – como a Era do Gelo – e tantas outras bobagens que lemos no dia a dia, é fácil saber que algo errado está acontecendo com o planeta. Basta se atentar às pesquisas científicas sobre o clima ou até mesmo a eventos notórios como as queimadas na Austrália no final do ano passado e os 20 graus que acometeram a Antártida recentemente.

O aquecimento global tem sido fruto da ação humana que, sob o lema de “progresso”, destrói a natureza. Por exemplo, continuamos a lançar inúmeros poluentes no ar, aumentando o efeito estufa que gera o degelo das calotas polares. Daqui a algum tempo, isso causará o aumento do nível do mar, matando diversas pessoas e acabando com diversos países.

Não é mais possível fechar os olhos para isso. Diversos setores da sociedade estão claros e cônscios de suas responsabilidades frente à crise ecológica que o século 21 enfrenta. A religião, como um aspeto importante da sociedade, não pode ficar de fora. Ela também precisa pensar e repensar o seu ensino sobre o meio ambiente. Principalmente o cristianismo, que ao longo dos séculos pregou e incentivou a exploração da natureza, interpretando erroneamente o versículo de Gênesis – que dizia para sujeitar a terra e dominar sobre os animais – sob o princípio do domínio predatório ao invés da "mordomia" sobre a qual o texto fala. Essa mancha na história, reconhecida já por muitos, deve também motivar novas teologias ecológicas, que assumam seu papel e motivem ações efetivas de combate à crise ecológica que vivemos.

As diversas religiões mundiais também devem, da mesma forma, tomar consciência do grande papel que desenvolvem na sociedade. Elas são chamadas a assumir a responsabilidade de transformação da mentalidade de seus fieis para que se importem com a natureza. A maioria delas, em seu cerne, consideram a natureza importante e necessária à humanidade, o que consta em seus textos sagrados. Essa importância também é dada nas religiões de matriz africana e indígena. Nelas, há diversos os rituais que necessitam da natureza e a têm como um dos elementos mais importantes nas oferendas e culto às divindades. Importa perceber que várias religiões têm despertado para a necessidade de se importar com a natureza, reconhecendo nela algo com valor em si mesmo e que, portanto, não deve ser explorado.

Nesse linha, aconteceu este ano, em Lisboa, o 3º Congresso Lusófono de Ciências da Religião, com o tema "Religião, ecologia e natureza". Em uma mesma mesa, representantes de um amplo espectro religioso abordaram a temática ecológica, a visão que cada religião tem acerca da natureza e como seria possível fazer algo efetivo para a transformação da sociedade no que tange a esse assunto.

O foco foi procurar não somente uma reflexão teórica, mas também incluir ações de ordem prática. Isso se percebia em diversos relatos, como a construção de templos ecologicamente corretos por comunidades hindus e muçulmanas em Portugal, ou ainda a mudança nas oferendas dos rituais nos cultos a Iemanjá, feitos na Bahia, de maneira que não poluam os mares.

Esses pequenos exemplos revelaram algo muito importante: as religiões têm um papel fundamental na educação de seus fieis no cuidado da natureza e, por isso mesmo, precisam assumir tal responsabilidade. Em outras palavras, não devem se abster de falar sobre a crise ecológica e propor, por meio de ações concretas, uma nova forma de viver em sociedade, que respeite os ciclos naturais, de maneira que a Terra continue sendo nossa casa comum.

*Fabrício Veliq é protestante e teólogo. Doutor em Teologia pela Faculdade Jesuíta de Belo Horizonte (FAJE), Doctor of Theology pela Katholieke Universiteit Leuven (KU Leuven), Bacharel em Filosofia e Licenciado em Matemática (UFMG) E-mail: fveliq@gmail.com

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