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"O dragão chinês anda a cuspir fogo"por José Brissos-Lino

27 setembro 2018

O Presidente Xi Jinping, está a consolidar o seu poder na China recorrendo também à perseguição religiosa com vista a uma sinicização do país

Depois de inventar o paradoxo “um país, dois sistemas”, conciliando aparentemente comunismo e capitalismo no mesmo espaço nacional, a China parece agora apostada em algo muito mais arrojado, uma campanha para obrigar todos os crentes, sejam cristãos, muçulmanos ou outros a jurar lealdade ao Partido Comunista. Alguns observadores consideram que se trata duma assimilação cultural (e política) forçada, uma verdadeira “sinicização” da religião em todo o país, até porque, para se ser membro do partido é necessário declarar-se ateu.

De acordo com as agências de notícias internacionais os cristãos chineses têm sofrido nos últimos tempos uma perseguição religiosa séria por parte do governo, que é acusado de queimar Bíblias, destruir cruzes, encerrar locais de culto à força e obrigar os fiéis a assinar documentos em que afirmam renunciar à sua fé. Isto tem sucedido em várias congregações cristãs de Pequim, Henan e noutras províncias da China.

É a primeira vez desde a fatídica Revolução Cultural de Mao Tsé-tung (1966-1976) que os cristãos são coagidos a assinar tais declarações sob pena de serem expulsos da escola ou de vir a perder benefícios sociais. Esta é também a mais grave repressão sistemática da fé cristã desde que a liberdade religiosa passou a estar inscrita na Constituição em 1982.

A organização não-governamental Human Rights Watch, vem denunciando detenções arbitrárias, tortura e a pressão permanente a que está submetida a minoria étnica muçulmana uigure na região de Xinjiang, e acusa Pequim de fazer do extremo noroeste do país num estado policial. Os uigures são detidos de forma arbitrária e encerrados em campos de doutrinação política sendo forçados a renunciar à sua religião e cultura, assim como a aprender o mandarim e a jurar lealdade ao Partido. O simples facto de aceder a sites estrangeiros ou estabelecer contacto com familiares no estrangeiro é razão suficiente para detenção. E quando não são detidos nos campos ficam vigiados por sistemas de análise de dados ou controlo dos telemóveis.

A teoria oficial para este atentado aos direitos humanos é, quando não a negação, a tentativa de justificar tais campos de detenção como “centros de educação vocacional”, por ser necessário “eliminar o extremismo religioso através da educação”.

Embora exista obrigação legal de registar toda e qualquer congregação religiosa na China, sabe-se que há largos milhões de crentes a frequentar as chamadas igrejas clandestinas, pelo que não existem estatísticas fiáveis para apurar a paisagem religiosa no país.

Em sentido inverso parece vir a necessidade de isolar Taiwan – a ilha independente – o que passa pela estratégia do governo chinês, que assinou recentemente com a Santa Sé um acordo provisório sobre a nomeação de bispos, de modo a que o Papa passe a ser o chefe da Igreja Católica na China, que conta oficialmente com 12 milhões de fiéis. A ideia é que, em contrapartida, o Vaticano passe a reconhecer os bispos chineses excomungados que foram nomeados pelo Governo comunista sem aprovação canónica.

Mas o facto de Pequim estar a aumentar a repressão aos cristãos e fiéis de outras religiões, parecia estar a dificultar esta possibilidade, considerada controversa na cúria romana, que receava que Francisco ficasse na mão do governo chinês, o que o obrigou a vir-se agora justificar com o precedente histórico do Portugal e Espanha medievais. Mas o Papa tem interesse em melhorar as relações rompidas em 1951, não só porque deseja acabar com a divisão entre católicos no país, como porque consta que o número de cristãos está a crescer rapidamente, embora se estime que o crescimento dos protestantes seja bem mais significativo.

O verdadeiro culto da personalidade prestado ao Presidente Xi Jinping, o seu reforço de autoridade apenas comparável ao do mítico líder da Grande Marcha, Mao Tsé-Tung, o crescimento económico chinês e a influência crescente e tentacular do regime no mundo, estão a disfarçar a repressão dos últimos tempos, denunciada por organizações dos direitos humanos e por agências noticiosas. O dragão chinês acordou e anda a cuspir fogo em várias direcções.

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